Caminhando na Graça

24.10.08

As aparências enganam


É... as aparências enganam... só vemos o que os nossos olhos vêem, o que, diga-se de passagem, é praticamente nada. Frequentemente me surpreendo com algumas pessoas que vou conhecendo e que não dava nada por elas, isso só reforça a tese de que Deus coloca tesouros em vasos de barro para que os mesmos não se gloriem...

O próprio Jesus não era lá um Brad Pit, tanto que Isaías diz que ele não tinha nenhum formosura ou aparência agradável que atraísse o olhar das pessoas... se fosse pela beleza ele não “venceria”. Ele também não tinha aparência de sábio, crentão ou mestre... ele era um com todos, comum como os outros, tanto que Judas teve que beijá-lo para que os soldados o identificassem. Além disso, ele era de origem pobre... seu nascimento se deu a partir de uma história controversa – sua mãe ainda virgem é inseminada pelo Espírito Santo e tem uma gravidez divina, o que deixa seu pai com a pulga atrás da orelha pensando em deixá-la mas é impedido por um anjo – seu nascimento foi marcado por um período de matança, fruto do medo de Herodes por um tal “Rei dos Judeus” que havia nascido em Belém; com isso foge pro Egito e recebe seus primeiros ensinamentos numa terra estranha, onde não tinham nada (deviam ter deixado casa e bens em Belém); seu pai, um carpinteiro, marcava a origem pobre do Messias... em alguns livros, Jesus é menosprezado por ser filho de carpinteiro, ainda mais de José, o que mostra que seu pai num devia ser o mais talentoso ou de maior credibilidade na época. Enfim, além dos atributos físicos, Jesus tinha questões de história familiar e finanças que também iam contra ele, tornando sua aparência ainda menos destacável no meio da massa.

Paulo, um dos grandes apóstolos, segundo os historiadores, era manco de uma perna, tinha problemas de vista e era calvo, tinha aproximadamente 1,50 metros de altura. Há indícios de que Paulo tinha problemas de saúde, padecendo de uma doença crônica e dolorosa, da qual ignoramos a natureza, mas que lhe terá sido um obstáculo à sua atividade normal. Por volta dos anos 58–60 ele descrevia-se a si próprio como um velho.

Davi quando foi ungido pelo profeta Samuel, num tinha a mínima aparência de rei, tanto que foi praticamente esquecido por seu pai, que fez questão de apresentar todos os outros belos e guerreiros filhos ao profeta antes de ver todas as outras opções esgotadas.

Enfim, a lista de aparência X realidade seria infinita...

Você pode estar se perguntando aonde quero chegar com isso...

É o seguinte: esses dias conheci um cara, um jovem, que já conhecia de vista mas que pelas companhias que o rodeavam era visto como mais um no meio da massa... mais um componente da massa de manobra... mas batendo um papo mais de perto, vi que o cara tem conteúdo... tem boas idéias, tem uma cabeça legal, é questionador... isso me fez pensar no quanto perdemos a oportunidade de crescer nos relacionamentos pelo nosso Pré-julgamento dos outros... nossa tentativa “cartomantiana” de julgar todos os livros pela capa, nos impede de conhecer os livros-pessoas e nos deleitarmos nas profundezas que cada um tem dentro de si.

Jesus, como o exemplo a ser seguido e plena representação do Deus-homem que é homem-Deus, se relacionava com todos... na verdade sua especialidade era achar pérolas em vasos de barro, relacionando-se mais com os que estavam a margem da sociedade (e eram demonizados pela mesma) do que com os líderes religiosos que tinham a reputação de homens de Deus. Ele estava junto dos ladrões, prostitutas, pecadores, miseráveis, pobres, doentes... sua vida foi marcada pelo serviço e relacionamento com os outros necessitados. Ele não se privava de conhecer os outros, já que entendia que todo encontro pode ser uma oportunidade de encontrar no outro a si mesmo, e provocar no outro o encontro consigo. Seu convite nunca foi uma proposta religiosa ou filosófica, mas um convite ao relacionamento... à caminhada da vida, ao partir do pão, ao “lava pés” dos que os sujam enquanto prosseguem. Seus ensinamentos eram baseados na troca relacional entre os homens e no amor como tempero promotor de relações de crescimento mútuo. Apesar de ser o “Rei dos judeus”, foi morto como um criminoso e com 2 ladrões dividiu seus últimos instantes... e mesmo nesses momentos de dor, não se privou de relacionar-se com estes indivíduos, que aparentemente eram inferiores a ele.

Meu convite é pra que sujemos os pés...troquemos abraços... palavras... carinho... que também troquemos farpas... que sejamos quem somos, mas esse Eu q eu sou, não me desvincule dos outros, porque apesar de eu ser um “eu único”, sou um “eu outro”, na medida que sou no outro e ele o é em mim quando nos relacionamentos e trocamos mais do que palavras e sentimentos, energias de vida. Que o medo de se machucar não nos prive de ser feliz e de achar nos outros a extensão do que nós somos... que a nossa arrogância não nos livre de aprender com os outros, mesmo os mais simples em entendimento e aparência, mas que podem guardar tesouros inimagináveis. Que as aparências que nos enganam num primeiro momento, não nos levem a escolher os “formosos e agradáveis”, porque não encontraremos Jesus entre os destaques da beleza.

E mais, se formos levados a escolher entre relacionar-se com alguém que parece ser bom e alguém q não parece nada, escolhamos o sem aparência, porque os que parecem ser, geralmente usam seu tempo e esforço pra parecer e não pra ser, já os outros, apesar de não parecer, investem o tempo disponível sendo quem são... e num mundo de padronização e estereótipos, ser quem se é, é uma dádiva a ser buscada.

 

“Seja você, mesmo que seja estranho... Seja você mesmo que seja bizarro (Pitty)...

As aparências enganam, aos que odeiam e aos que amam
Porque o amor e o ódio se irmanam na fogueira das paixões
Os corações pegam fogo e depois não há nada que os apague
se a combustão os persegue, as labaredas e as brasas são
O alimento, o veneno e o pão, o vinho seco, a recordação
Dos tempos idos de comunhão, sonhos vividos de conviver
As aparências enganam, aos que odeiam e aos que amam
Porque o amor e o ódio se irmanam na geleira das paixões
Os corações viram gelo e, depois, não há nada que os degele
Se a neve, cobrindo a pele, vai esfriando por dentro o ser
Não há mais forma de se aquecer, não há mais tempo de se esquentar
Não há mais nada pra se fazer, senão chorar sob o cobertor
As aparências enganam, aos que gelam e aos que inflamam
Porque o fogo e o gelo se irmanam no outono das paixões
Os corações cortam lenha e, depois, se preparam pra outro inverno
Mas o verão que os unira, ainda, vive e transpira ali
Nos corpos juntos na lareira, na reticente primavera
No insistente perfume de alguma coisa chamada amor

(Elis Regina)


P.S. - Jonathan, tem sido um grande prazer nosso contato... uma surpresa agradável ver você emergir do meio da massa pra ser mais um que faz a diferença. Mantenha-se firme sendo quem você é: essa metamorfose ambulante... um camaleão, q cada hora parecendo ser uma coisa diferente aos olhos dos outros, em essência é sempre a mesma coisa: um ser que é-mudando e muda-sendo.

Grande abraço!